O narrador é heterodiegético, ou seja, não é uma personagem
da história.
Assume, geralmente, uma atitude de observador.
Marcas linguísticas: verbos na 3ª pessoa; pronomes e
determinantes na 3ª pessoa; discurso indirecto livre (nesta obra).
O narrador omnisciente sabe tudo sobre as personagens: o seu
passado, presente e futuro, bem como os seus sentimentos e desejos mais
íntimos. É como um deus que tudo viu e tudo sabe. Verificamos que o narrador do
romance conhece todo o passado dos Maias, sabendo mais sobre eles do que as
próprias personagens. Isto permite-lhe arquitectar o romance, jogando com
várias técnicas narrativas ao nível do tempo do discurso (por exemplo, a
analepse).
Um exemplo concreto do conhecimento do narrador
relativamente à interioridade das personagens é o momento em que mostra
conhecer os sentimentos que Afonso não expressa quando o filho, Pedro, surge
perante ele, desesperado com a fuga da Monforte. (Final do cap. II – p. 44 – “Uma
sombria tarde de Dezembro…”)
O ponto de vista, ou perspectiva narrativa, corresponde à adopção,
por parte do narrador, de uma determinada posição para contar a história.
Perspectivar a diegese de acordo com uma determinada focalização
não é só ver a diegese por certos olhos; é tomar em relação a ela uma posição afectiva
e/ou ideológica. Constituir-se-á assim uma imagem particular da história,
configurada pela subjectividade da personagem que a perspectiva.
N’Os Maias é fundamentalmente sobre Carlos que recai a
focalização interna: as outras personagens dependem da sua visão do mundo e é a
sua subjectividade que atua como elemento filtrante da realidade observada.
A focalização interna valoriza o universo psicológico de
Carlos e proporciona uma visão crítica da sociedade.
O ponto de vista de Carlos é sobretudo evidente nas
passagens em que a obra nos dá a conhecer Maria Eduarda (o primeiro
avistamento, o primeiro encontro,…). Aliás, parece ser na caracterização desta
personagem feminina que o narrador mais abdica da sua omnisciência. Mas também
existem outros exemplos da focalização interna de Carlos, como o jantar do
Hotel Central ou o Passeio Final, em que a visão crítica da decadência do país
é filtrada pelo olhar do protagonista.
Ao privilegiar a focalização interna, o narrador vê, sente e
julga os eventos ficcionais com e como a personagem, o que, por outras
palavras, significa que as leis da subjectividade da personagem condicionam a
imagem da diegese que é veiculada.
A focalização interna adopta por vezes a perspectiva de João
da Ega. Um exemplo relevante deste ponto de vista são os episódios do jornal “A
Tarde” e do Sarau no Teatro da Trindade.
Outro exemplo digno de nota em termos de focalização
interna, é o ponto de vista de Vilaça (pai), através do qual se apresenta a
educação de Carlos em Santa Olávia.
O narrador pode também optar pela focalização externa, ou
seja, a simples referência aos aspectos exteriores da história contada: por
exemplo, o aspecto físico das personagens, a sua vestimenta, ou os espaços
físicos onde se movimentam.
Esta atitude narrativa é especialmente empenhada na
superficialidade e transmite, com objectividade, apenas aquilo que é
observável.
No entanto, n’Os Maias, a objectividade é, muitas vezes,
apenas aparente. Assim, existem vários exemplos de utilização de adjectivos, de
advérbios e de diminutivos que conferem subjectividade aos eventos narrados.
Os exemplos que mais se destacam correspondem à descrição de
Eusebiozinho ou à de Dâmaso. Encontramos aqui a focalização interventiva, com a
função de comentário, aliada à adesão ou negação a/de comportamentos ou formas
de estar das personagens. Pode ter uma função ideológica, por exemplo na
apresentação da personagem Alencar, já velho, no jantar do Hotel Central.
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